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Próximo Futuro

Próximo Futuro

13
Abr12

Pensar Fora da Caixa

Próximo Futuro

A conversa informal é o centro de todo o projecto: são 8 painéis temáticos, cada um com um moderador que algumas vezes é também curador, seleccionando ou sugerindo convidados. Todos podem intervir: desde quem está no público a quem está a acompanhar através das redes sociais e do livestream

 

 

 

O Desafio da Programação e Curadoria

 

Host: João Vasconcelos (Canal 180)

 

Convidados: Sérgio Hydalgo (Zé dos Bois) Daniel Ribas (Estaleiro / Curtas de Vila do Conde) Lúcia Marques (Próximo Futuro / Gulbenkian) Manuel Henriques (Trienal de Arquitectura de Lisboa)

 

Este é o painel central do #pfc2012sim, uma conversa com instituições nacionais e internacionais dedicadas à cultura, e que a interpretam e trabalham de forma diferente. Quais são os desafios de quem programa para o público da actualidade? Da música às artes plásticas e ao cinema, como estão a desenvolver projectos que acompanham a conversação de uma audiência com uma mobilidade muito diferente de há alguns anos atrás?

 

 

 

15 Abril, Conservatório de Música de Coimbra.

Mais informações em Pensar Fora da Caixa.

03
Mai11

"Arriscar aquilo que abre caminhos": conversa com o programador-geral do PRÓXIMO FUTURO

Próximo Futuro

 

 

Breve vislumbre do artigo "Arriscar aquilo que abre caminhos, conversa com António Pinto Ribeiro", por Marta Lança no BUALA.

 

ML: Como passa da dança para as questões interculturais e pós-coloniais?

APR: A relação não é directa nem casual. Acontece que, depois da minha formação em Filosofia e em especial Estética, fui convidado para criar um campo de estudos teóricos na recentíssima Escola Superior de Dança. Aceitei e pensei “vamos lá estudar”. E foram anos de leituras compulsivas sobre tudo o que havia sobre dança, corpo, coreografia. Poderia ter sido cinema, literatura, artes visuais, teatro que foram sempre áreas do meu interesse. A dança funcionou durante anos como a ponta de um iceberg. Depois, uma enorme curiosidade que me é própria, levou-me a ver espectáculos, filmes, concertos que não eram necessariamente da tradição ocidental e branca, o fascínio pelo continente africano e pelas questões de cultura e de ideologia a elas associadas conduziram-me ao multiculturalismo; inicialmente, diga-se, de uma forma muito inocente.

 

ML: É o seu método de trabalho, uma curiosidade de abertura ao mundo?

APR: Mais do que método, é uma forma de estar que tem consequências muito produtivas. Mas também estou em crer que, a determinada altura, uma certa fisicalidade e corporalidade presentes nestas experiências evocaram a minha infância e adolescência em África, o que me motivaria a revisitar alguns países africanos.

 

(...)

 

ML: E parece-me que incluir reflexão e não apenas divulgação é uma linha muito sua… Sempre se interessou por cruzar o mundo teórico com propostas artísticas?

APR: Acho essencial, em todas as instituições, que a linha de programação seja comunicada. No meu entender a programação cultural decorre de um contrato entre os públicos e os artistas ou os autores. O programador é um mediador mas, nesse contrato que faz, deve anunciar aos parceiros a sua missão, as suas opções e a razão das mesmas. A programação cultural baseia-se numa linha de argumentação cujo destinatário é um auditório tendencialmente universal. Por outro lado, os públicos devem ter acesso a chaves de aproximação ao que lhes é apresentado, o seu modo original de produção, se já foi apresentado noutro contexto, etc. Torna tudo muito mais claro e resgata a legitimidade que não se tem se não for devidamente informado. Isso pode ser feito de forma interessante e criativa. A programação cultural é uma actividade fascinante que tem tanto de risco como de fruição e de partilha raras. Mas exige uma atenção permanente e um cuidado com os públicos, artistas, formadores de massa crítica e uma vigilância permanente sobre o poder que se adquire nesta actividade. É fulcral uma auto-crítica permanente que não permita que se substitua ao artista nem ao público, sem contudo ceder a gostos massificadores ou à pressão daqueles que acham que representam os artistas.

 

(...)

 

ML: O que é para si a verdadeira interculturalidade? 

APR: No mais vasto conceito, a interculturalidade pode constituir uma estratégia de negociação cultural que conduz à construção de um projecto político de transformação das sociedades multiculturais. E alguns equívocos ou afirmações demagógicas são desde já de evitar. O primeiro de todos é o de que a cultura e pela cultura se resolvem os conflitos e os antagonismos. Nada de mais errado. A cultura pode constituir uma plataforma de aproximação, um modo negocial, mas nunca resolverá os grandes antagonismos, as grandes diferenças de interesses. Em caso algum, devemos pois deslocar para a cultura os problemas específicos das esferas da política, da economia e da religião. O segundo equívoco é pensar que a cultura é um bem e que, per si, contagia de bondade toda a acção humana. No que uma estratégia intercultural pode ser útil é no esclarecimento, tornando claros os conflitos e as suas razões, mas nem sempre eliminando-os. Aliás, a interculturalidade não pressupõe um reino definitivo da paz, inclui sim a possibilidade de tensão desejavelmente produtiva. Um último equívoco que se coloca é o que tende a divorciar os fundamentos culturais dos religiosos ou, pelo contrário, reduzir ao religioso. Desde T.S. Elliot pelo menos, que devemos saber que as culturas estão impregnadas de religião, o que se reflecte na produção cultural. E é assim que podemos falar de uma cultura cristã, presente mesmo em autores laicos, ou de artistas hindus e que, portanto, a interculturalidade transporta sempre traços de interreligiosidade.

Um quarto é aquele que concebe o interculturalismo como um diálogo entre blocos culturais homogéneos, em que todos os membros de uma cultura se identificam de uma forma absoluta. Na verdade, não existem blocos culturais homogéneos, e na mesma região cultural há ricos e pobres, mulheres e homens. E as pessoas identificam-se e agrupam-se também por clubes, orientações sexuais, associações profissionais, o que permite, por um lado, estabelecer pontes de comunicação entre regiões culturais diferentes e, por outro, encontrar fissuras entre membros das mesmas regiões.

A interculturalidade não é, pois, uma ideologia. Como estratégia, é uma forma inovadora de conviver e co-habitar nas sociedades contemporâneas, com a diversidade de grupos culturais e étnicos. De algum modo, é o estado mais evoluído da democracia mas, tal como esta, exige uma construção permanente e diária. É importante reconhecer igualmente que a interculturalidade faz-se a partir de vários pontos de partida, e não pode resultar de uma legislação ou normatização regrada apenas pela comunidade que acolhe. Supõe, por isso, uma negociação cultural cujo limite é a rejeição de todo e qualquer sofrimento infringido a alguém, a exclusão social, religiosa ou sexual.

Finalmente, tanto ou mais importante do que o já existente património cultural das diásporas, é admitir e até estimular a combinação cultural e o sincretismo que constituem o melhor índice de interculturalidade contemporânea. Só uma prática cultural e um programa político que combata o ressentimento face ao passado e privilegie o futuro tem a ver com a interculturalidade e a sua prática.

 

(...)

 

ML: Os Centros Culturais, provenientes do período cultural, enquanto mecanismos de controlo, de representações nacionalistas e promoção da língua, em alguns casos conseguiram transformar-se em plataformas interessantes de produção articuladas com artistas locais, mas é muito raro, porquê?

APR: O que acontece na maior parte das situações em África é que os grandes centros culturais das cidades são a única coisa que existe, então a responsabilidade é grande. Depende muito do director do centro: quando as pessoas são activas, interessadas, inteligentes, cultas as coisas correm bem. São as únicas plataformas possíveis de entendimento entre os artistas e intelectuais que lá se encontram e o lugar para apresentar produção local. Acho fulcral que os Centros Culturais Portugueses, por exemplo, possam apresentar programações de França ou Itália como o reverso também deve ser válido pois, afinal, são o lugar de apresentação das produções africanas. Não é o que acontece, normalmente são coisas bacocas, nacionalistas e anacrónicas. Nos casos dos Centros Portugueses as pessoas estão lá há 15 anos sem relação com a cultura contemporânea portuguesa a representar uma portugalidade que só existe na cabeça deles, e sempre se sentiram estranhos no país onde estão. Com excepções, é certo.

 

ML: Isto parte de um problema maior de não haver articulação, nem estratégia, nem investimento. Como experiências interessantes, refere o caso da política cultural brasileira. O que temos a aprender com o Brasil nesse capítulo?

APR: Imenso, a capacidade que eles tiveram de criar organizações intermédias entre as grandes instituições e o nada. Os Pontos de Cultura foram das coisas mais interessantes pois correspondem à escala do lugar onde foram instalados, às necessidades com um elevado grau de exigência.

 

(...)

 

ML: Voltando à sua programação, continua a equilibrar a produção europeia com estes estímulos de fora, que nos fazem repensar o nosso próprio esgotamento criativo.

APR: Acho que é muito estimulante. Houve uma fase em que a programação era para dar visibilidade a produções não europeias que mereciam ser vistas. Essa fase foi bem cumprida. Mas queria que concebêssemos como um lugar em que se criasse coisas novas a partir do que já foi a sua História, já não se trata de montra e mostra, implica ter um público e comunidade de artistas que olhe para isto de uma maneira diferente. Estou muito grato com o facto de o jardim Gulbenkian se ter tornado lugar de deleite de chineses, ucranianos, e que pessoas muito jovens tenham perdido o medo de frequentar lugares de cultura. 

 

(...)


 

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