"Gritomudonomuro"
O embate de dois matemáticos com as confissões cifradas e eróticas que uma artista plástica espalhou pelas ruas do Rio.
Um trecho da mureta da via expressa que liga a Zona Sul do Rio de Janeiro à Barra da Tijuca apareceu coberto de inscrições ilegíveis numa manhã do ano passado. Era uma sequência de símbolos, pintados em tinta branca, que ocupava toda a altura do pequeno muro. Estendia-se por mais de 100 metros e tinha quase 400 sinais compridos e estreitos. Vários deles eram repetidos, o que sugeria tratar-se de um alfabeto. As letras tinham ângulos retos e poucas curvas. Algumas lembravam a escrita latina – era possível identificar um I, um X, um Y espelhado, um U de ponta-cabeça. Não havia espaço que delimitasse as palavras. Se aquilo fosse mesmo uma mensagem, era incompreensível.
Inscrições semelhantes haviam sido deixadas em muros e viadutos da Gávea, da Lagoa, do Leblon e bairros adjacentes. Há mensagens escritas no alfabeto enigmático num acesso ao túnel Rebouças, no muro de uma escola e na frente do Jardim Botânico. A meio caminho entre o grafite e a pichação, os escritos costumam ficar na parte de cima de muros altos e outros lugares improváveis. Com frequência, são associados a uma figura humana longilínea e estilizada, com os braços e pernas finos e as costelas realçadas.
A autoria das inscrições foi reivindicada pela primeira vez no início de 2011. Numa reportagem da revista dominical d’O Globo, a artista plástica carioca Joana César contou que era ela quem espalhava as mensagens pela cidade. Estavam escritas num código que criara mais de uma década antes, para preservar seus segredos de pré-adolescente, que anotava numa agenda. Acrescentou uma revelação apimentada: algumas inscrições contavam suas fantasias eróticas. Sem saber, os cariocas conviviam havia anos com relatos íntimos, escritos em letras garrafais na cara de todos.
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